Tive o prazer de escrever mais um artigo para o Alma de Viajante. Desta vez, um tema mais prático. Como organizar uma ida a Machu Picchu. Aqui fica o texto.

Machu Picchu – manual de sobrevivência
Este não é o género de texto que costume escrever. Mas deu-me tanto trabalho chegar a Machu Picchu que achei por bem partilhar a minha experiência à laia de manual de sobrevivência para o viajante independente. 
Infelizmente, para quem gosta de viajar ao sabor do vento, Machu Picchu não é um lugar onde se possa bater à porta e entrar. Antes pelo contrário, é daqueles sítios, que obrigam o viajante a planear a sua ida com meses de antecedência. Meses? Não, não é uma hipérbole. São mesmo meses! 
Passei horas a ler guias, blogs e a recolher informações de outros viajantes. Vi como operam os tours organizados. E no final fiz um puzzle da informação, chocalhei, baralhei e voltei a dar. Segui algumas dicas. Noutros casos, fiz o contrário. Por fim, utilizei uma das minhas técnicas preferidas, a da Ovelha Negra. Mas, vamos por partes:

Preço
Talvez tenha ouvido dizer que o Peru é um país barato. Tal é verdade para quem foge dos locais hiper turísticos. Porém, visitar Machu Picchu é caro. Um dia no cimo desta magnifica montanha implica a entrada no Sítio Arqueológico (de 24€ a 40€), o bilhete de comboio (pelo menos 100€) e ainda um autocarro (23€). A isto recomendo acrescentar um pequeno tour em grupo (10€). Por isso, prepare-se para gastar cerca de 160€ por pessoa (isto se levar água e umas sandochas).

Onde dormir
Onde dormir? Não me refiro ao hotel, mas sim à cidade (ou vila) que lhe vai servir de base. A meu ver, há três opções: Aguas Calientes, Cusco ou algo pelo meio. 
Aguas Calientes, a pequena vilória no vale junto a Machu Picchu, é, infelizmente, um aglomerado de prédios feios que cresceu desorganizadamente com o afluxo de turistas. Para além disso, é cara e o serviço deixa muito a desejar. A sua única vantagem é a localização, bem no sopé das montanhas onde fica este monumento. A não ser que queira tentar ver o nascer do sol na montanha, num dos poucos dias não nublados do ano (por alguma razão a floresta que a circunda é chamada de Húmida), não há vantagem em ficar aqui. Os viajantes que estão a fazer a trilha Inca, indo a pé até Machu Picchu, também pernoitam por Aguas Calientes. Se assim não for, recomendo optar por uma das vila no Vale Sagrado para servir-lhe de base durante uns dias.
Outra opção é começar a sua viagem em Cusco. A antiga capital Inca é uma cidade mágica, que merece ser visitada com calma. Mesmo muita calma, pois fica a mais de três mil metros de altitude e com ladeiras bem íngremes. Daí que quem aqui começa a sua estada nos Andes tem, no mínimo, garantida uma grande dor de cabeça. Sim, a falta de oxigénio tem os seus efeitos secundários e as qualidades terapêuticas do chá de coca não são infinitas. Portanto, se planear uns cinco dias nesta parte do Peru (o que não é muito), guarde o final da visita ao Vale Sagrado para aqui pernoitar em Cusco (o seu corpo vai agradecer).
Das pequenas vilas do Vale Sagrado escolhi Ollantaytambo. Uma simpática terra, muito bem localizada no Vale Sagrado. Tem estação de comboio para ir directamente para Machu Picchu e pode usá-la como base para visitar o resto do vale (que não deve ser descurado). E, a sua altitude pouco superior a dois mil metros, permite-lhe fazer uma boa aclimatização antes de se dedicar a “escalar” as ladeiras de Cusco.

Os bilhetes para Machu Picchu
Esta é uma das fases mais complicadas do processo. Há diversos bilhetes e horários à escolha: 
•    Apenas o sítio arqueológico de Machu Picchu.
•    O sítio arqueológico de Machu Picchu e Huayna Picchu (o bilhete mais “raro”. Tente reservar com uns três meses de antecedência).
•    O sítio arqueológico de Machu Picchu e a Montanha de Machu Picchu (aquela que fica nas “traseiras” da típica fotografia de Machu Picchu).
Além do mais, alguns bilhetes têm um número de vendas diário muito limitado. Portanto, se não tiver cuidado, a sua ida a Machu Picchu pode condicionar toda a sua viagem ao Peru! E se pensa que pode chegar lá e comprar um bilhete na candonga, esqueça, pois o seu bilhete está personalizado e só lá entra com a apresentação do passaporte (ou fotocópia). Com direito a uma carimbadela da “alfândega Inca” e tudo.
Por isso, assim que puder, compre os seus bilhetes online em www.machupicchu.gob.pe. Contudo, certifique-se que há bilhetes de comboio para o dia e hora escolhidos. Não convém ficar apeado. Quanto maior o grupo, no meu caso éramos seis, mais difícil se torna este processo de compra de bilhetes (vai dar por si, a testar datas, com várias páginas da internet abertas).
Como ir
Esta parte é fácil. Para quem não vai a pé montanha acima, a única maneira de ir para Machu Picchu é de comboio. O percurso até à estação de Aguas Calientes segue ao longo do rio Urubamba, que só por si, já vale a viagem. E em seguida montanha acima, aos ziguezagues num pequeno autocarro, mesmo até à entrada do parque.
Há duas companhias a fazer o percurso de caminho de ferro e os bilhetes podem, e devem ser, comprados online (http://www.incarail.com/ ou http://www.perurail.com/), assim que tiver comprado os seus bilhetes de entrada para Machu Picchu. Os horários e preços são bem variados pelo que, mais uma vez, a compra antecipada pode significar uma grande poupança.
Logo que comprar o bilhete, irá receber, por email, um voucher que depois, já no Peru, servirá para levantar, na bilheteira da estação, os bilhetes do comboio (e isso implica a apresentação do seu passaporte ou fotocópia). Pois… Nada é simples.
Chegado a Aguas Calientes terá ainda que comprar o bilhete do autocarro. Felizmente o último, para subir até ao sítio arqueológico propriamente dito. É um esplêndido percurso de cerca de 30 minutos, ziguezagueando montanha acima. 

O que levar
O parque arqueológico é bastante grande e, quem quer, acaba por andar bastante. Leve apenas uma pequena mochila com o essencial (água, comida e um impermeável). 
Se for como eu e as fotos do telemóvel não o satisfazem, recomendo uma câmara fotográfica que seja leve. E não deixe de levar um bom zoom para melhor captar os pormenores da paisagem. Uma câmara fotográfica mirrorless alivia o peso sem comprometer a qualidade (fazer link com artigo do Alma de Viajante sobre a escolha de câmara fotográfica). Eu uso uma Fuji (com a qual fiz as fotografias do artigo). A qualidade é soberba e no fim do dia não tenho o ombro dorido.

Como fazer
Não sou, de todo, daqueles viajantes que gostam de planear a sua viagem ao minuto. Aliás, a surpresa é um elemento que procuro nas minhas viagens. Muitas das recordações de viagem que guardo com mais carinho vieram do imprevisto (ou do improviso). Todavia, e não é demais repetir, aqui não dá! O meu planeamento teve apenas um objectivo, ir a Machu Picchu com o menor número de pessoas possível.
Mas, então, o que fiz de tão diferente? Na verdade nada de especial. Reparei que muitos tours são “vendidos” para ir ver o nascer do sol em Machu Picchu. Apenas optei, por não o fazer. A isto chamo a técnica da Ovelha Negra. Ou seja, fugir a sete pés dos rebanhos (de turistas), fazendo o inverso do que a maioria faz (na verdade, a minha mulher, a Joana, é a verdadeira “criadora” desta técnica que tem vido a aprimorar ao longo dos anos). Nem sempre é fácil. Por vezes, é até impossível. Porém vale sempre a pena tentar! E desta vez resultou. 
Assim sendo, aproveitei para dormir até a uma hora civilizada. Apanhei o comboio e cheguei a Aguas Calientes pelas 10:00. Segui logo no primeiro autocarro para o topo da montanha, sem tempos de espera. E já lá em cima, contratei o tour e passei pela bilheteira, mais uma vez, sem ter qualquer fila. 
O sítio arqueológico encontrava-se repleto de turistas (mesmo não sendo época alta), mas com a paciência ainda em alta e concentrado nas explicações da guia, a manhã passou a correr.
Findo o tour, e com o estômago a reclamar (no sítio arqueológico não se pode comer nem há casa de banho), saí para uma pausa retemperadora que se revelou de charneira. Foi com espanto que, enquanto comia, via a fila para o autocarro de regresso, passar de grande a monstruosa. Ou seja, os turistas que, pouco dormiram, e chegaram a Machu Picchu para ver o nascer do sol, estavam a debandar às centenas! Para eles o dia tinha terminado. Para mim ainda nem estava a meio. Assim, regressei para junto dos monumentos e tinha Machu Picchu só para mim (e mais uma pequena centena de pessoas).
A tarde foi dedicada a palmilhar, de lés a lés, este local mítico. Não apenas os antigos templos e palácios. Mas, principalmente percorrer as veredas que nos levam até à ponte Inca e à porta do Sol. E, de caminho, apreciar a paisagem, a floresta tropical e as árvores, cobertas de bromélias e orquídeas. Só me ficou a faltar subir ao Huayna Picchu, cujo bilhete não comprei com a antecedência necessária!
Acima de tudo, passei o resto do dia a usufruir do local. E que bom foi poder sentar-me descansadamente a ver o tempo mudar nas montanhas que me cercavam. Os historiadores e arqueólogos que me perdoem, mas, para mim, Machu Picchu vive da sua paisagem e da sua beleza natural. Aliás, acho que os Incas tinham a mesma opinião. Senão porque fazer uma cidade num local tão inacessível.
Agora posso dizer que fui a Machu Picchu e gostei! E o tempo gasto em planeamento foi fundamental para que assim fosse.
May 3, 2017

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